Mas se
você se acha um Carlos Drummond de Andrade, ou um Ferreira Gullar ou um
Fernando Pessoa sinta-se à vontade para escrever o que quiser e como quiser. Não
se preocupe com rimas porque isso é só uma brincadeira que inventaram para
distrair nossa atenção. Poeta que é poeta sabe que a poesia de verdade está nas
entrelinhas.
Já
participei de concursos literários e sempre observava a diversidade de poemas
que apareciam. Já vi muita coisa por aí de qualidade questionável daqueles que
se dizem “poetas”, mas quem sou eu para julgar, né? Então dessa vez resolvi
brincar com tudo isso e tive a ousadia de me inscrever num concurso outra vez.
Os mais observadores
que entendem do assunto vão perceber que o poema tem algumas “frescurinhas”,
como o fato de todos os versos possuírem doze sílabas poéticas e outras coisas.
Talvez um verso ou outro não tenha as tais doze sílabas, mas... dane-se, talvez
nem os jurados tenham notado.
Poema,
piada ou protesto
Se nem conhece
canções pra rir ou chorar
Como alcançar sua
alma ou tocar seu coração?
Que outros alvos os
poetas vão explorar?
Não há novos caminhos
nessa direção
São só maneiras
diferentes de viver
Nesse mundo de homens
cada vez mais dispersos
Comemore se achar um
que possa dizer
Qualquer mensagem
traduzida em prosa e versos
Se fizesse versos
como o Pessoa fazia
Seria como mais um
heterônimo seu
Quero deixar claro
que brinco com poesia.
Com sentimentos não
brinco nem com os meus
É fácil demais rimar
verbos entre si
Mas muitos verbos em
versos não dizem nada.
Pensa que é fácil
fazer um poema assim?
É preciso ser mais
que uma rima forçada
Basta uma palavra
certa no lugar certo
Para qualquer cidadão
chegar até aqui
Não precisa sorte ou
talento, seja esperto
Diga aquilo que os
jurados querem ouvir
Mas se a intenção é
impressionar a comissão
Que julguem então a
consciência de vocês
Rimas pobres carecem
daquela "emoção"
Quer saber? Tanto faz
para um povo burguês
Verso encerrado com
verbo no infinitivo?
Não me diga que usa
esse truque infantil!
É quase uma fala de
um povo primitivo
Que eu aceitaria só
até o nível juvenil
E não abuse de verbos
num mesmo verso
Outra dica: sem
metáforas complicadas
Afinal, ninguém quer
um público disperso
já arrependido por
ter saído de casa
Exageram na
quantidade de adjetivos
Que viram ricas
palavras sem conteúdo.
Um novato se esforça
para ser conciso
E acaba fazendo o
pior verso do mundo
Não se preocupe tanto
com rima ou métrica
Eles toleram até a
mais grotesca falha
Eles não sabem o que
é sílaba poética
Assim fica fácil
ganhar uma medalha
E se a métrica é
disfarce, sou ilusionista
Um truque barato que
se aprende sozinho
Basta fingir lágrima
para ser artista
Que os aplausos
aparecerão no caminho
É o que acontece com
quase tudo na vida
Nossas mentiras
sempre estiveram na moda
Ninguém quer trabalho
sem fama garantida
Nesse país justo só
da boca pra fora
Mas eu não sou jurado
nem nada importante
Só vim aqui para
espairecer as ideias
Porque já cansei das
rimas da minha estante
E os verdadeiros
poetas estão na plateia
Vim ouvir o que os
novos versos vem dizer
Talvez alguma rima
aqui fique famosa
E tenho outras ideias
querendo nascer
Que
ainda são só rascunhos em verso e prosa
Duvido que essas
estrofes subam ao pódio
A menos que criem
outra categoria.
Que tal "Melhor Poema
Causador de Ódio"?
Ou "As Quinze
Melhores Estrofes de Ironia"?
É claro que não
ganhei medalha alguma, ainda mais falando desse jeito, mas valeu a experiência.
Se esse poema chegou onde chegou é porque alguém lá tinha senso de humor. E é
isso que importa. O melhor de tudo isso foi saber que um dia a Ironia sorriu
para a Poesia e vice-versa.
Guigo é autor do blog www.doiscuringas.blogspot.com e não aguenta mais ouvir pagodeiro e sertanejo
universitário rimando "amor" com "dor", "emoção" com "coração", "momento" com "sentimento", e "balada" com "namorada", “noitada", "madrugada" e até com "tchê
tchererê tchê tchê".
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