domingo, 28 de abril de 2013

Boa sorte, garoto!



Nunca ganhei um brinde sequer nessas coisas decididas por sorteio, mas vai que um dia...

Sempre preencho aqueles cupons promocionais de lojas e postos de gasolina. É sempre um cupom a mais perdido naquele misterioso buraco negro levando meu nome e o "x" na resposta certa. A cada cupom é como se uma voz de dentro da urna dissesse "Vai, Guigo, ser sortudo na vida".

Já testei a sorte em rifas também. Não sou supersticioso, mas nunca mais escolho nome de parente em rifas. Minha família é grande o suficiente para preencher praticamente toda a cartela da rifa, excluindo, claro, nomes foneticamente desagradáveis como Klebiellen, Bucicleide ou Hemengarda. Nas rifas já escolhi nome dos pais, do irmão, dos tios, tias, primos e primas e nunca ganhei nada. Estranhamente, não havia nas cartelas o nome da minha avó, que é a pessoa mais sortuda da família. Acabei chegando à conclusão de que o azarado não sou eu, mas o resto da família.

Hoje penso duas vezes (ou mais) antes de participar de uma rifa. Penso na relação custo/benefício. Penso em ajudar a pessoa que está rifando o prêmio. Penso para ver se o objetivo é só brincadeira. E penso que os outros dirão que sou antissocial se eu não participar da rifa. Mas aí penso que não tem nada de antissocial em não participar da rifa daquele sujeito que está precisando de grana, mas que gasta boa parte do salário comprando cigarro, cerveja e outras drogas. Aí penso: "Coitado o cacete! Antissocial porra nenhuma!"

E no bingo? Bem, foi nos bingos da vida que conheci os irmãos gêmeos Sorte e Azar, filhos da Dona Esperança e do falecido Seu Pessimismo. Foi quando tive uma prova de que a esperança é mesmo a última que morre.

O bingo tinha sido organizado pelo pessoal de uma paróquia a fim de arrecadar recursos para os projetos da igreja. Dias antes eu e minha esposa havíamos comprado duas cartelas para concorrer ao prêmio principal: um tablet. Pensei: "R$10,00 por duas cartelas... um tablet que deve custar quase 50 vezes isso... se não ganharmos, pelo menos contribuiremos com alguma coisa. E acho que vai ser divertido. Vamos lá!".

A noite do bingo começou com outros prêmios menores, mas atraentes. Cada rodada custava R$ 1,00 e dava direito a duas cartelas para concorrer a prêmios como uma cesta de café da manhã, um edredom e outros, além de prêmios em dinheiro. E eu, com meu histórico de má sorte, obviamente não estava ganhando nada, mas até que estava curtindo aquele ambiente com gente civilizada, divertida e barracas de comes e bebes. (Desculpe pela expressão "comes e bebes", eu odeio essa.)

Numa rodada em que o prêmio era em dinheiro, R$ 20,00, a Sorte veio até mim e pude gritar "BINGO!". Foi um momento histórico. Se fosse um filme, nessa hora estaria tocando Carruagem de Fogo, tudo estaria em câmera lenta e ficaria nisso por uns dois minutos mostrando a cena em diferentes ângulos. Em frações de segundo fiz listas do que eu poderia fazer com R$ 20,00:

1) Comprar mais duas cartelas para a rodada do tablet e guardar o resto no porquinho; ou

2) Por crédito no celular; ou

3) Comprar 300g de queijo muçarela, 200g de peito de peru, um suco de maçã, cinco pães e um pacote de biscoito de polvilho; ou...

Antes de começar a quarta lista fui interrompido por mais quatro pessoas gritando "bingo!" também. Foi então que percebi que não era a Sorte que tinha vindo a mim naquela hora, mas seu irmão gêmeo, o irônico Azar. Como eles podem ser tão parecidos?

Resultado: já que o prêmio tinha sido em dinheiro, resolveram dividir os R$ 20,00 entre os cinco "sortudos", então cada um ficou com R$ 4,00. O que fiz com o prêmio? Uma pizza brotinho e um refrigerante. E ainda tive que interar R$1,00. É mole?

Na rodada do tablet, a última e a mais aguardada da noite, o clima era de tensão. Todo mundo procurando a tal Sorte, mas ela não poderia estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Talvez estivesse com aquele cara que tinha acabado de ganhar sozinho R$ 60,00 investindo só R$ 1,00 na rodada, ou então com aquela velhinha humilde e simpática com casaquinho de crochê que posicionava suas quatro cartelas na mesa. Quatro cartelas! QUATRO! Mas o que aquela velhinha faria com um tablet? Será que ela sabia o que era um tablet? Talvez pensasse que fosse um tablete de chocolate, só que importado, sei lá.

Tive um momento de reflexão: "Peraí! O que EU faria com um tablet? Eu também não preciso disso. Mas por R$ 5,00, por que não? Dá até pra vender depois por um bom preço. Negócios, negócios..."

Mas o que valia era a brincadeira. Estava mesmo tudo muito engraçado. Um garoto ali estava eufórico nos últimos números sorteados. Faltava só um para aquele desesperado faturar o prêmio. Até eu comecei a torcer por ele.

É claro que não ganhei o tablet. Nem eu, nem a velhinha, nem a minha esposa que, aliás, ganhou um brinde num dos sorteios que aconteciam nos intervalos entre as rodadas e ainda passou o resto da noite rindo da minha cara por eu ter ganhado só R$ 4,00.

Mas no próximo bingo estaremos lá de novo. Vai que um dia...

Ah! Sim, aquele moleque ganhou o tablet. 



Guigo é autor do blog www.doiscuringas.blogspot.com e está proibido de entrar em Las Vegas. Na verdade ele está proibido de sair de lá até que arranje dinheiro para pagar o que deve aos cassinos.

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